domingo, 7 de novembro de 2010

a arte de dessentir

Repetindo o que já disseram, este livro é uma experiência antes de ser uma leitura.
Já que é preciso contemporaneizar sua postura intelectual e percepção social para apreciar as palavras deste bloco de histórias, extenda então esta postura para as situações cotidianas.



* Se a estética é a ciência do sentir, então Os anões de Veronica Stigger sugere algo com uma ciência da dessensibilização, uma anestética.

(...)

Aristóteles definia a tragédia como mimesis práxeos, uma “imitação dos atos”, que suscita o terror e a piedade. Em Veronica Stigger temos algo como um “sistema de atos”, sem terror e sem piedade, no que seria a tragédia contemporânea, a tragédia da falta de terror e de piedade. Georges Bataille, ao estudar o sacrifício como modelo da representação artística, e em especial da tragédia, apontou nele o aspecto essencialmente espetacular, que faz com que a morte seja sempre e unicamente revelada por identificação com a vítima, por pessoa interposta, e nunca no próprio sujeito, impedido de ser consciente da própria morte. O que o fez declarar que o sacrifício é simplesmente “uma comédia”. Pergunto-me se aqui também, nas narrativas e micro-narrativas de Veronica Stigger, não encontramos elementos para pensar o que sobra da tragédia na contemporaneidade, na falta de tragédia e de sacrifício que caracteriza o nosso tempo, todo ele convertido simplesmente em comédia. Comédia da imagem.


*João Camillo Penna é professor de
Literatura Comparada e Teoria Literária na UFRJ


* vide sinopse e dados tecnicos em Comentários.

Um comentário:

Palavras na Brisa Noturna disse...

dados técnicos
OS ANÕES
Autor: Veronica Stigger
Quarta capa: Mario Bellatin


Detalhes
Formato cartonado;
Projeto gráfico: Maria Carolina Sampaio;
Dimensões: 120 x 160 mm;
Páginas: 60; Peso: 0,39
ISBN 978-85-7503-698-3

“Estou convencido de que uma das características de um livro contemporâneo é que, antes de ser uma leitura, ele é uma experiência”. Essa é a porta de entrada sugerida pelo escritor mexicano Mario Bellatin no texto de quarta capa de Os anões, terceiro livro da gaúcha radicada em São Paulo, Veronica Stigger. A experiência de que fala Bellatin ganha aqui a forma de histórias breves, uma prosa radical e corrosiva.

Esta crítica ficcional dos dilemas contemporâneos da arte também está presente em contos como “Tatuagem”, em que a contradição entre arte e mercadoria dói na carne, e “Teleférico”, em que a ideia de espetáculo é levada às últimas consequências. Stigger consegue fazer do humor um instrumento ao mesmo tempo de alegria e de desespero; temos aí, às vezes, um riso nervoso e macabro, não uma franca gargalhada. Resta, anota Mario Bellatin, nos conformarmos com “os feitos extraordinários como banalidades necessárias para continuar sendo o que somos: seres insignificantes”.